quinta-feira, 17 de maio de 2007
Francisco Mignone
Algumas idéias de Francisco Mignone recolhidas para nossa apreciação:
"Não se pode escrever para as gavetas. Veja Wagner: chegou ao máximo da complexidade com o Tristão. Aí sentiu o perigo; e recuou para os Mestres Cantores. Veja o segundo ato de Aída: é grande música; e é música para todos, não para uma elite. A música vem do povo e deve voltar para o povo. Há algo na boa música que sugere de alguma forma a dança. Foi assim desde o começo da história humana" (1). "... Na idade provecta a que cheguei, posso afirmar que sou senhor e dono, de direito e de fato, de todos os processos de composição e decomposição que se fazem e usam hoje e amanhã. Nada me assusta e aceito qualquer empreitada desde que possa realizar música. O importante para mim é a contribuição que penso dar às minhas obras. Posso escrever uma peça em dó-maior ou menor, sem dor nem pejo, assim como elaborar conceitos de música tradicional, impressionista, expressionista, dodecafônica, serial, cromática, atonal, bitonal, politonal e quiçá, se me der na telha, de vanguarda com toques concretos, eletrônicos ou desfazedores de multiplicadas faixas sonoras. Tudo se pode realizar em arte, desde que a obra traga uma mensagem de beleza e deixe no ouvinte a vontade de querer ouvir mais vezes a obra. Não acontece isso também nas outras artes?" (2).
Vasco Mariz nos conta que "Mignone foi talvez o músico mais completo que o Brasil já produziu. Compositor de primeira ordem, excelente professor, experimentado regente, virtuoso do piano, acompanhador insuperável, notável intéprete de música de câmara, poeta aceitável, escritor cheio de verve, intelectual de ampla cultura geral, tornou-se uma das figuras mais importantes da história da música clássica brasileira. Vasco Mariz vê duas principais contribuições de Mignone para a música brasileira: "o conjunto de obras orquestrais inspiradas em temas afro-brasileiros e os seus lieders, ainda hoje muito populares entre os recitalistas. Saliento seus trabalhos para piano solo, entre os quais se destacam as 12 Valsas de Esquina (1938-42). Nelas retratou admiravelmente o ambiente sonoro dos chorões das primeras décadas do século XX no Rio de Janeiro, utilizando sua técnica pianística de modo a dar-lhes uma fluência extraordinária - cada nota surge e se encadeia com notável espontaneidade. Ao lado das valsa de Nazareth, as de Mignone não empalidecem; até as complementam" (3). A propósito, vejam esse vídeo com o depoimento de Mignone, que conheceu Nazareth.
Na compilação de discos 78 rpm incluída neste post podemos ouvi-lo ao piano e com um conjunto orquestral, interpretando composições próprias (4) e de Ernesto Nazareth (Brejeiro e Duvidoso), Eduardo Souto (Despertar da Montanha e Núvens), Moacir Braga (Cascata de Lágrimas) , Carlos Gomes (Quem Sabe) com Cristina Maristany (5), Alberto G. Fiuza (Celeste e Suave Tormento) ambas com o clarinetista Antenor Driussi (6).
Clique aqui para baixar a compilação
Notas:
(1) In: Luiz Paulo Horta - Francisco Mignone - Jornal do Brasil, 26/11/84;
(2) carta para Vasco Mariz, 1980, op. cit. pg. 193.
(3) YouTube
(4) Coca, Lenda Sertaneja Nº7, Miudinho, Valsa Choro Nº1, Valsa Choro Nº2, Valsa Choro Nº3, Valsa de Esquina Nº3, Valsa de Esquina Nº4,
Valsa de Esquina Nº7, Valsa de Esquina Nº8.
(5) cantora lírica, portuguesa, ainda criança foi morar no Rio de Janeiro. Um dos principais nomes do canto lírico ligeiro no Brasil tendo gravado várias obras de música popular. Estudou piano e canto, recebendo aulas da grande professora de canto Cândida Kendall e com Madame Poukine, na Europa.
(6) primeiro clarinetista da Orquestra do Teatro Municipal de SP. Foi aluno do também clarinetista e violoncelista Guido Rochi, solista de clarineta da Ópera do La Scala de Milão.Rochi foi muito ativo como professor fundador do Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, em 1906.
Fontes: IMS (discos); YouTube (vídeo); FBN (foto).
Bibliografia:
(1) FBN
(2) História do Clarinete
(3) Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira
(4) A Música Clássica Brasileira / Vasco Mariz. - Rio de Janeiro : Andrea Jakobsson Estúdio, 2002, 192p.